sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Do almoço irrealizável ao confronto com a polícia



Foto: Keilon Feio
Congestionamento. Sol coberto por nuvens cinza. Calor abafado. Automóveis dobrando na avenida Presidente Vargas. Mais carros do que o habitual. Avenida Boulevard Castilho França interditada por algum motivo.
Caminho palas calçadas da Presidente Vargas. Vez ou outra me esbarra alguém. Pessoas apressadas. Horário de almoço. Minha barriga reclama. Estou com apenas um real no bolso. Vagar por aí sem ter nada para pensar e fazer, apenas o estômago a reclamar. No mais, estava tudo perfeito.
Então avistei um senhor e sua “bicicleta-lancheira” na esquina com a rua Manoel Barata. Ele vende umas coxinhas frias e ensopadas de óleo. Ele tem um aspecto português. Talvez seja descendente. Pedi uma coxinha de carne com suco de goiaba. Ele pergunta se eu quero maionese e ketchup. Sim, eu quero. E ele faz um corte longitudinal no salgado e despeja o tempero.
- Quanto deu? – pergunto julgando ser um real.
- Um e cinqüenta – respondeu-me ele.

“Estou fodido”. Pensei. “Por outro lado, esse senhor não vai querer me foder por causa de cinqüenta centavos”.

Era uma questão de conversa, jogo de cintura. Sair correndo não era a opção mais indicada. Então, eu expliquei que havia perdido o dinheiro do meu almoço e só agora eu notei e que eu tinha apenas um real. Ele disse tudo bem na próxima você me paga.
E desci o restante da avenida Presidente Vargas, vencendo os ambulantes, o pessoal dos “Vamos tirar o seu cartão de crédito, senhor?” e os habituais pedintes sentados na calçada com as mãos estendidas. Alguma coisa estava acontecendo no rumo do Ver-o-Peso. Eu precisava saber o que era.
- AQUI A GENTE TÁ TRABALHANDO, COMPANHEIRO! – uma voz ressoava alto e forte de uma caixa amplificada de um carro-som. Algo me trouxe à lembrança o nosso presidente. – AÍ VEM O PESSOAL DA SECON E LEVA TODO O GANHA-PÃO DO TRABALHADORES HONESTO, COMPANHEIRO! ISSO É UM DERESPEITO COM A CRASSE TRABALHADORA. NÃO VAMO LIBERAR A RUA, COMPANHEIRO!
Aquele senhor me pareceu mais uma cópia defeituosa do original usuário da palavra “companheiro”.
No meio da Castilho França, na frente do complexo de feiras do Ver-o-Peso, objetos em chamas impossibilitavam o fluxo de veículos naquela área. Os ambulantes protestavam contra a retirada de suas mercadorias. Eu queria ver o que seria resolvido para com os trabalhadores irregulares da feira.
- OLHA OS HOMI VINDO! – gritou uma jovem puta que fazia programa por ali ao ver a polícia em passos coreografados vindo em nossa direção com armas empunhas.
O cheiro do peixe-frito socava com fúria o meu olfato sensibilizado pela fome, o calor asfixiante intensificado pelo ajuntamento humano. Vais, objetos lançados contra os polícias e palavras de protestos. Eles avançaram, fizeram mira em nossa direção, meu coração acelerou, minha respiração ficou áspera e difícil. Corremos para o interior da feira enquanto os polícias atiravam balas de borrachas e lançavam bombas de gás. Escondi-me atrás do primeiro boxe que vi e fiquei como entrincheirado só espiando por cima a ação. Uma senhora já bastante idosa passa mal ao lado, uma mulher grita palavras de baixo calão contra a tropa e outra bomba é lançada ao lado do boxe que e eu me encontrava. Chiado e fumaça, mais disparos. Gritos, paus lançados como resposta, correria e mais gritos.
- Acalme-se, senhora – disse para velhinha agachada ao meu lado tentando parecer calmo. Eu estava para me cagar nas calças.
- TEM UMA SENHORA PASSANDO MAL AQUI, SEUS FILHOS DA PUTA! – gritou novamente minha vizinha do boxe ao lado.
- TEM CRIANÇA TAMBÉM! – gritou alguém mais atrás.

POU, chiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii – outra bomba de efeito moral e muita fumaça e mais gritos e correria.

Depois chegou a mídia: câmeras, microfones, repórteres, fotógrafos. Depois o corpo de bombeiros para apagar as chamas, um secretário no sei do que foi recebido às vais e pedradas. Muita reclamação aos repórteres por parte dos ambulantes e logo depois o trânsito voltou ao normal.

2 comentários:

D.J. Dicks disse...

So uma dicaantesdecomprarqualquer coisa , perguntar o preço primeiro éessencial

Flávia disse...

Presidente Vargas... linda, mas no melhor estilo "welcome to the jungle" ;)

Beijos =D