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sábado, 20 de outubro de 2018

Conheça a Editora Itacaiúnas



A Editora Itacaiúnas, fundada no ano de 2014, é voltada principalmente para publicação de livros, prestação de serviços editoriais e gráficos. Nosso foco editorial prioriza publicações de autores que tenham como base teórica uma abordagem interdisciplinar, voltada para as questões das áreas das ciências humanas, tecnológicas e ambientais. 
Missão
Prestar serviços e oferecer produtos destinados a atender às demandas de seus clientes com qualidade, comprometimento, respeito, confiabilidade e agilidade para sanar dúvidas. Além de promover eventos que valorizem a cultura e a arte nacional através de seletivas e concursos para compor a publicação de títulos inéditos.
VisãoSer uma opção viável, inovadora e acessível a todas as pessoas que desejam publicar, divulgar e comercializar os seus trabalhos acadêmicos, literários, técnicos e etc com suporte impresso e/ou virtual.
ValoresCompromisso, ética, dedicação, confiabilidade, inovação e respeito.
Conselho editorial
Contamos com Conselho Editorial formado por doutores e mestres atuantes em diferentes Instituições de Ensino Superior do Brasil e do mundo.
Sobre a palavra/ nome itacaiúnas
Itacaiúnas é um rio brasileiro, que nasce no estado do Pará na Serra da Seringa no município de Água Azul do Norte, e é formado pela junção de dois rios, o Rio da Água Preta e o Rio Azul. Desemboca na margem esquerda do Rio Tocantins, na sede da cidade de Marabá.


Para conhecer nosso trabalho basta acessar:
http://www.editoraitacaiunas.com.br


segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Lygia Fagundes Telles: A escrita como vocação



Numa tarde de junho de 2012, a escritora Lygia Fagundes Telles recebeu o Portal Literal em seu apartamento, no bairro dos Jardins, na capital paulista, com vinho do Porto e biscoitos amanteigados, para uma conversa sobre sua trajetória. Quando surgiu na sala, nada indicava que ali estava uma mulher de quase 90 anos. Sua força, beleza e extrema gentileza são impactantes.  “Vocês não vão beber?! Bebam!”, a todo momento incitava a equipe a beber mais vinho.
Sentada no lugar predileto, ao lado das plantas, em frente à estante repleta de fotos e lembranças de familiares, cercada por pinturas, algumas do filho Goffredo da Silva Telles Neto, Lygia relembrou, ao longo de quase duas horas, episódios do passado, recitou versos guardados na memória, falou dos queridos amigos (Clarice, Caio F., Drummond, Érico Verissimo), da sua relação com a escrita e seus personagens, do lidar com a vida e a morte. O que impressionou na força de seu depoimento é o amor pelo ofício, dedicação de vida ao “chamado” que recebeu ainda mocinha na escola.
Neste encontro, Lygia Fagundes Telles, a menina contadora de histórias que aceitou sua vocação para se tornar uma das mulheres mais respeitadas da literatura brasileira, revela-se tão grande quanto a sua prosa repleta de magia, o poder criador de suas palavras.

Portal Literal: A senhora disse recentemente em uma entrevista que, na juventude, foi pobre e subversiva. Como lidou com essas dificuldades iniciais e de que forma foi subversiva?
Lygia Fagundes Telles: Eu tive uma infância rica. Meu pai era um homem maravilhoso, mas era um jogador, então, jogou tudo. Então eu tive que trabalhar para pagar meus estudos. Era uma luta. Além da luta normal, a luta com a palavra. Como dizia o Drummond: “Lutar com a palavra é a luta mais vã, contudo lutamos mal rompe a manhã”. Além da luta pelo dinheiro, havia a luta pela palavra. Era uma luta dupla. Fiquei então uma lutadora. Só faltou botar aquelas luvas de box [risos]… Foi uma juventude muito difícil, muito complicada. Mas fui até o fim. É preciso coragem. Carlos Drummond de Andrade tem outro poema do qual eu gosto muito: “Penetra surdamente no reino das palavras, lá estão elas em estado de dicionário e te perguntam, sem interesse pelas respostas: trouxeste a chave?”. É muito bonito isso. Essa chave de abrir as palavras, de abrir a própria vida, essa chave exige uma luta, e é uma luta bonita. E assim eu fui. Então eu me acostumei desde cedo a essa imposição. “Vai, vai… trouxeste a chave?”. Essa pergunta eu fiz a mim mesma muitas vezes e a mim mesma eu respondi.

PL: A senhora chegou a ser afetada pelas ditaduras que testemunhou?
Lygia: Muito. Vou contar uma história para vocês. Eu era uma mocinha, com pulôveres fechados, cabelo escorrido. Durante uma manifestação, ia segurando a bandeira brasileira com outras moças do Largo São Francisco, e, atrás, o estandarte da Faculdade de Direito. Então o Getúlio Vargas mandou ordem para São Paulo para que não permitissem que os estudantes falassem. Então eu fui a uma casa de tecidos e pedi uma tela preta, essas que cobrem os defuntos, porosas, para pormos na boca. Já que o Getúlio tinha proibido falarmos, então íamos com aquele tira para a rua. Eu cheguei na loja e disse: “Me veja um tecido preto poroso, desses que cobrem os defuntos”. Ele trouxe a peça e eu pedi: “Por favor, uns 3 ou 4 metros”. Ele me olhou e perguntou: “Mas o defunto é grande assim?” [risos]. Saímos todos com a tira na boca, em protesto. Justamente nessa nossa caminhada havia um rapaz ao meu lado, também com um pano preto. De repente ele caiu no chão, vomitando sangue. Por detrás vinha a Polícia Militar metralhando. As lojas fecharam as portas. Um horror.  Foram arrancados os livros de vários poetas e prosadores das vitrines. Foram proibidos vários poetas e prosadores que eram considerados ofensivos à ditadura de Getúlio Vargas. Eu sei que tem gente que ama o Getúlio, e eu respeito esse amor. Mas eu tinha horror a ele. Os estudantes também, incluindo o que morreu do meu lado, vomitando sangue. Eu fui para o hospital e quando cheguei em casa minha mãe estava tendo um ataque, porque não tinha televisão nessa época, só o rádio, e ela escutou pelo rádio que os estudantes da Faculdade de Direito do Largo São Francisco tinham sido alvejados pela PM e que um dos estudantes ou uma estudante, estava morrendo no hospital. A minha mãe pensou: é a minha filha!
Agora, depois… Durante a ditadura militar eu estava escrevendo o romance “As meninas”. E nesse romance há uma jovem que é justamente a subversiva. Tem a mocinha, que é a Lorena, bonitinha e tal, família rica, tudo em ordem. Tem a outra que é a Ana Clara, que chamam de Ana Turva, a drogada. E tem a terceira que é justamente a subversiva, a Lia. Eu penso sempre que o escritor tem que ser testemunha do seu tempo e da sua sociedade. Nesse romance eu quis testemunhar aquele tempo e aquela sociedade através de três jovens, a burguesa, a subversiva e a drogada.

PLE quanto ao panfleto que incluiu nesse livro?
Lygia: Eu estava com Paulo Emilio Salles Gomes, meu segundo marido, na minha casa, na Rua Sabará quando recebemos um panfleto extraordinário de um homem torturado pelo DOI-CODI, pela Polícia Militar. Recebi esse panfleto e disse: “Paulo, que panfleto terrível, está dizendo coisas horrendas, ele está contando coisas horrendas que ele viveu”. E então perguntei: “O que eu faço com isso?”. Ele respondeu: “Coloca no seu livro”. E eu coloquei, está lá em “As Meninas” a tortura que esse homem sofreu no DOI-CODI, o sapato enfiado na boca, ele dependurado no pau de arara, os choques elétricos nas partes… Ditadura Militar… Por isso que a Comissão da Verdade é da maior importância, porque é a nossa história, não pode ser omitida, tem que ser trazida ao público para todos saberem o que aconteceu.

PL: A senhora costuma ter algum ritual para escrever?
Lygia: Ausência, silêncio… Eu, de um certo modo, me fecho com meus personagens e fico com eles ao meu redor. Eu levo uma vida muito fechada comigo mesma, gosto muito de música, ouvir Wagner, Beethoven, Chopin, ouço muito concertos, gosto muita da TV Cultura, eles têm programas excelentes… Fico fechada comigo mesma porque, embora eu não seja uma companhia maravilhosa para mim mesma, acabo me divertindo comigo. Então fecho a porta.

PL: E quando um livro chega ao fim?
Lygia: Quando eu estava terminando “As meninas”, eu estava em Barra de São João, província do Rio de Janeiro, numa chácara onde eu ouvia o mar. Era madrugada quando terminei. E de repente comecei a chorar porque eu estava me despedindo das minhas personagens, não ia tê-las mais comigo, era o adeus. Aí  uma personagem veio, sentou no meu colo e disse: “Eu sou tão interessante, você não vai me aproveitar outras vezes?”. Eu disse: “Vamos ver…”. Ela disse: “Eu voltarei com máscara”. As personagens são como nós mesmos, elas querem viver mais tempo, elas não querem ser encerradas no livro.  Elas criam digamos que vida própria e exigem um tempo. Oswald de Andrade escreveu uma coisa engraçada. Ele disse que um personagem já atormentou tanto ele, toda hora vinha, “Olha eu aqui!”, então ele pegou e jogou a personagem no mar, afundou e nunca mais. Mas eu queria dizer o seguinte, as personagens ficam em torno do escritor, conversam com o escritor, exigem vida própria. São como nós mesmos, não querem morrer. Querem continuar, então, nessa vontade de continuação eles voltam mascarados. Você tira aquela máscara e vê: “Ah, mas você é aquele lá!”.

PL: A senhora e Clarice Lispector foram amigas. Como começou essa amizade? E por que ela lhe mandou não sorrir nas fotografias?
Lygia: A Clarice gostava muito dos meus livros, eu estava no Rio de Janeiro, passando lá  uma temporada. Ela me procurou e disse: “Lygia, precisamos nos impor porque na literatura do Brasil não levam a sério as mulheres. Fica séria não ria, você ri demais, não pode, tem que manter a cara fechada.” Ficamos amigas. Depois fomos juntas pra Colômbia, para um congresso de escritores.

PL: E a senhora também era uma leitora da Clarice?
Lygia: Eu tinha grande admiração pela Clarice. Já tinha lido os primeiros livros, os contos, “O Lustre”, os primeiros livros dela, e nós tínhamos muitos amigos em comum. A Clarice era muito amiga do Erico Verissimo, que gostava muito dela. Eu era muito amiga dele também, então falávamos sobre o Erico e os nossos amigos comuns, sobre a vida, sobre a morte, sobre o amor, as nossas conversas eram muito longas e ela repetia [imitando Clarice]: “Eu creio, Lygia, que nós mulheres estamos muito pouco consideradas no Brasil, mulher não é ouvida nem lida no Brasil, vamos nós duas nos impor! Não ria, fica como eu, brava mesmo!”.

PL: Certa vez um jornalista perguntou para Clarice por que ela escrevia, e ela respondeu com outra pergunta: “Por que você bebe água?”. Você mesma já se fez essa pergunta? E se há uma resposta, é uma resposta que tem se mantido com o passar do tempo?
Lygia: A vida inteira, desde menina, eu contava historias. Quando não sabia escrever, inventava histórias de lobisomem, de alma penada, histórias horríveis. Um dia comecei a escrever nos meus cadernos de escola as histórias que eu contava. Foi assim, o começo foi esse. Uma professora viu no meu caderno, nas paginas no final do caderno, uma história minha e disse: “Menina, vem cá”. Era uma professora de História. “Por que você está escrevendo essas bobagens aí?”.  E eu, pela primeira vez assumi a minha vocação: “Não é bobagem, é uma história que eu inventei”. Vocatio, vocação; vocare, chamado.
Desde sempre eu contei histórias. Não me vejo em outra situação a não ser contando histórias quando criança. Não considero meus primeiros livros, apaguei da minha história, da minha vida, os primeiros contos, que considero “juvenilidades”. Começo, isto sim, a considerar meu trabalho a partir do livro “Ciranda de Pedra”, o resto, como diria Shakespeare, o resto é silêncio.

PL: Fale-nos de sua amizade com Caio Fernando Abreu e Carlos Drummond de Andrade.
Lygia: Caio era meu querido amigo, conversávamos muito sobre a nossa profissão, de mãos dadas, conversávamos muito sobre essa paixão comum que nos levava a escrever, e que nos fazia feliz escrevendo. O Carlos Drummond de Andrade foi um amigo que me ajudou muito… Ele disse: “Tinha uma pedra no meio do caminho, no meio do caminho tinha uma pedra”. Um dia eu vi escrito num mural, na rua: “Tinha um caminho meio da pedra”.  Que bonito isso! Se o Carlos Drummond fosse vivo eu mandaria pra ele essa mensagem: No meio na pedra tinha um caminho: a esperança.
É engraçada uma coisa… Na realidade os meus maiores amigos sempre foram homens. Desde a faculdade de direito, homens. Boas amigas e tal, mas os homens eram meus amigos maiores, não só na juventude como depois. Até um padre! Tenho um amigo padre. De vez em quando eu olho pra ele e digo: eu preciso me confessar! E ele diz, “Você não precisa”. É engraçado isso, a minha proximidade com o sexo masculino foi muito profunda sempre. Mas claro que também tive boas amigas. Mulheres fortíssimas, boas escritoras, sem a menor… sem aquele sentimento de inveja, rivalidade.

PL: A morte é um tema, uma questão recorrente em sua escrita. Como a senhora se relaciona com essa questão?
Lygia: É um tema difícil… Você teria que acreditar na imortalidade da alma, que você vai continuar…  Às vezes eu acredito muito na imortalidade da alma nesse sentido. Tem um filósofo, cujo nome eu agora esqueci, que dizia: “Já fui um mancebo, já fui uma donzela, já fui um pássaro azul nas florestas e já fui um peixe mudo do mar”. Eu acredito na reencarnação, acredito… Se você for decente, honesto consigo mesmo e com os outros nesta encarnação, você vai ser uma coisa boa na próxima. Ser bom agora, porque você vai ser recompensado pela sua vida reta e justa atual.

PL: Como a senhora vê a situação do escritor atualmente, no Brasil?
Lygia: Principalmente no Brasil, os nossos livros não são lidos. Nós estamos num país onde seus os maiores e melhores escritores, um Manuel Bandeira, um Carlos Drummond de Andrade,  ou mais lá atrás, um Machado de Assis, não são lidos. Se alguém aqui for amigo da nossa presidente, da qual  eu gosto muito, mandaria um recado pra ela, um recado com o coração na mão: O dia em que o Brasil tiver mais creches e mais escolas, terá menos hospitais e menos cadeias. Outro recado que eu trago pra Dona Dilma, é um recado que vem lá da China, das antigas dinastias chinesas: Antes de sair para melhorar e consertar o mundo, dê três voltas dentro da sua casa. Ela tem muita coisa pra fazer aqui, a Dona Dilma pode ficar mais aqui conosco, ela vai encontrar muita coisa pra fazer e vai fazer muito bem porque ela é muito boa.

PL: A Clarice costumava perguntar aos seus entrevistados: “O que é o mais importante na vida?” Gostaríamos de repetir a pergunta dela para a senhora.
Lygia: Há varias coisas muito importantes, eu creio que seria injustiça da minha parte fazer uma classificação. A vida é dificílima, eu acho a vida muito difícil, então o melhor é você se aproximar de quem você ama, se puder, ficar com esse amor, amar a sua profissão, que é a sua vocação. Em latim, vocatioVocare, chamado. Você precisa obedecer ao seu chamado. Se você ama escrever, você tem que escrever, se você ama dançar, vai dançar. É tocar piano? Vai, pega o seu piano, se não tem piano, venda sua roupa, o seu sapato, venda o que tem, compra um piano e toca piano. Você tem que se aproximar, tem que se entregar à sua vocação, como o coração na mão, aí você fica feliz, aí você faz feliz a sua mulher, o seu homem, seja quem for, mas você precisa se entregar, obedecer a vocação. A vocação é um chamado que diz: “faz isso, não aquilo!”. Eu sempre obedeci a minha vocação, então,  cheguei a essa idade avançada, como dizia mamãe, já dobrei o cabo da boa esperança [risos], mas obedecendo a minha vocação, que é escrever. Essa é a minha felicidade. Diante de deus eu posso dizer: “Eu cumpri minha vocação, aqui estou.”
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Texto: Ramon Mello e Manoela Sawitzki

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Os múltiplos eus de Fernando Pessoa



Fernando Pessoa foi uma das vozes mais importantes da poesia universal. Seus textos refletem o “histeroneurastênico”, como o poeta se autodefinia, apaixonado por ocultismo, filosofia, por estudos de psiquiatria e psicanálise. Autodidata de grande erudição, Fernando Pessoa constituiu um caso único de desdobramento de si mesmo em outras personalidades poéticas. Este fenômeno é conhecido como heteronímia, ou seja, a capacidade de desdobrar-se em poetas imaginários.
Fernando Pessoa nasceu em 1888, em Lisboa, vindo a falecer na mesma cidade, em 1935, com apenas 47 anos. Embora tenha participado intensamente das publicações do Modernismo português, seu único livro publicado em vida foi Mensagem, (baixe a obra Mensagem de Fernando Pessoa aqui!)  obra com a qual participou de um concurso de poesia do Secretariado de Propaganda Nacional, em Lisboa, em 1934, pouco antes de morrer.
Dentre esses heterônimos de Fernando Pessoa, que são diversos, estão os mais conhecidos da obra do autor: Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro.

Álvaro de Campos: o poeta das sensações do homem moderno.

Multipliquei-me, para sentir,
Para sentir, precisei sentir tudo,
Transbordei, não fiz senão extravasar-me,
Despir-me, entreguei-me,
E há em cada canto da minha alma um altar erguido a um deus diferente.
(Trecho do poema “Passagem das horas”)

Ricardo Reis: o poeta neoclássico

Fragmento 1
Para ser grande, sê inteiro: nada.
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alva vive.

Alberto Caeiro: o poeta-pastor

O rebanho é os meus pensamentos
 E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
(trecho do poema “Sou um guardador de rebanhos”)

Além de Mensagem o poeta escreveu: “Poemas completos de Alberto Caeiro”, “Odes de Ricardo Reis”, “Poesias de Álvaro de Campos”, “Poemas dramáticos”, “Poesias coligidas”, “Quadras ao gosto popular”, “Novas poesias inéditas” entre outras obras, incluindo, textos em prosa.

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Fonte consultada para esta postagem:                  
Português: novas palavras: literatura, gramática, redação / Emília Amaral [et al.]. – São Paulo: FTD, 2000.
Foto: http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa

E MAIS


domingo, 21 de outubro de 2012

A poesia pedagógica de Gabriela Mistral

Gabriela Mistral (1889-1957)

A professora e poetisa chilena Gabriela Mistral - pseudônimo de Lucila María del Perpetuo Socorro (1889-1957), nasceu numa pequena comunidade do Chile por nome Vicuña no Vale de Elqui.

Sua obra literária transmite muito de sua trajetória, como professora, nas salas de aula das escolas rurais aos arredores da província de La Serena, onde vivia. Gabriela Mistral atuava no magistério desde seus 15 anos de idade, o que veio refletir em seus poemas um caráter bastante pedagógico. Sua obra é uma verdadeira lição para quem pretende um dia trabalhar em sala de aula, principalmente, com crianças.

O reconhecimento definitivo da obra de Mistral veio, em 1945, com o Prêmio Nobel de Literatura, que reconhecia em sua autora um símbolo das aspirações idealistas de todo o mundo latino-americano. Esta foi a primeira vez que a homenagem foi prestada a um autor(a) latino-americano(a).

Dentre sua produção literária selecionamos o poema “La maestra rural” (A professora rural). Inspirada na imagem humana e lírica da irmã, sua verdadeira educadora e guia com quem aprendeu a ler e escrever. Seus versos a caracterizam como professora pura, pobre, alegre, um ser “doce”. Esses versos são da obra “Desolación” (Desolação), publicado nos Estados Unidos da América, em 1922.

A seguir os belos versos de A professora rural de Gabriela Mistral, traduzidos para o português por Luis Marcos Sander:


A PROFESSORA RURAL
Para Federico de Onís

A professora era pura “Os suaves hortelãos”,
dizia, “deste prédio, que é prédio de Jesus,
hão de conservar puros os olhos e as mãos,
guardar claros seus óleos, para dar clara luz

A professora era pobre. Seu reino não é humano.
(Assim no doloroso semeador de Israel).
Vestia saias pardas, não enjoiava sua mão
e todo o seu espírito era uma imensa joia!

A professora era alegre. Pobre mulher ferida!
Seu sorriso foi um modo de chorar com bondade.
Por sobre a sandália rota e avermelhada,
este sorriso, a insigne flor de sua santidade.

Doce ser! Em seu rios de méis caudaloso,
longamente dava de beber a seus tigres a dor.
Os ferros que lhe abriram o peito generoso
mais largas lhe deixaram as bacias do amor!

Oh lavrador, cujo filho de seu lábio aprendia
o hino e a prece, viste o fulgor
do luzeiro cativo que em suas carnes ardia:
passaste sem beijar seu coração em flor!

Camponesa, lembras que alguma vez prendeste
seu nome a um comentário brutal ou fútil?
Cem vezes olhaste, nenhuma vez a viste
e no solar de teu filho dela há mais do que ti!

Passou por ele sua fina, sua delicada esteva,
abrindo sulcos onde alojar perfeição.
A alvorada de virtudes de que lentamente se neva
é sua. Camponesa, não lhe pedes perdão?

Dava sombra por uma selva seu carvalho fendido
no dia em que a morte a convidou para partir.
Pensando em que sua mãe a esperava adormecida,
À dos olhos Profundos se entregou sem resistir.


E em seu Deus adormeceu, como em coxim de lua;
Travesseiro de suas fontes, uma constelação;
canta o Pai para ela suas canções de berço
e a paz chove longamente sobre seu coração!

Como um repleto vaso, trazia a alma feita
para derramar aljôfares sobre a humanidade;
essa era sua vida humana a dilatada fenda
que costuma abrir o Pai para lançar a claridade

Por isso ainda pó de seus ossos sustenta
púrpura de roseiras de violento chamejar.
E o cuidador de túmulos, como aroma, me conta,
os mapas daquele que marca seus ossos, ao passar!

Outros poemas de caráter pedagógico de Gabriela Mistral são: “La oración de la maestra” (A oração da professora), “Palabras a los maestros” (Palavras aos professores), “Pensamientos pedagógicos” (Pensamentos pedagógicos), “Llamada por el niño” (Chamamento pela criança) “Pasión de ler” (Paixão de ler) e “Contar”.


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Fontes consultadas: ADAMS, Telmo. "Gabriela Mistral e a educação das nossas crianças" e POET SEERS. "Gabriela Mistral (1945)" Disponível em: http://www.poetseers.org/nobel-prize-for-literature/gabriela-mistral-1945/ Acesso em: 21/10/12.