quinta-feira, 1 de agosto de 2013

NAQUELE BAR, NAQUELA NOITE DE NATAL

 

Passava um pouco mais da meia-noite e a madrugada escorria lentamente e todos os bares da cidade jaziam fechados. Pelo menos era o que aparentava. Talvez por ser Natal, 25 de dezembro de 2007. Início de terça-feira. E certamente, muitos estariam naquele momento reunido com seus familiares bebendo horrores e trocando presentes com abraços, em sua maioria, falsos e sorrisos idem.
Enquanto isso, Eduardo e Silvio vagavam pelas ruas solitárias à procura de um bar que naquele horário da madrugada estivesse aberto para atender suas almas sedentas de cerveja e música; vida e cor, mas não havia nenhum bar aberto. Não, não desistiriam tão facilmente assim. Continuaram vagando calados e absortos. Relembrando vez ou outra algum fato do passado, mas que ainda soava tão alto em suas vidas: um amor frustrado, uma oportunidade perdida.
E o vinho com as três cervejas que tomaram anteriormente na casa de um amigo começava a abandonar seus corpos. Estavam ficando sóbrios e nenhum bar surgia no horizonte.
No entanto, como todos devem saber: Papai Noel não se esquece de ninguém. Surgi então, como um oásis em meio ao deserto, um belo e agradável bar de mesas de madeira, postas nas calçadas, música de alta qualidade, pessoas bonitas e inteligentes. No menu, bebidas de todos os gêneros. Iluminação febril e uma noite não tão mais hostil.
E assim seguiram bebendo suas cervejas sem que nada de extraordinário acontecesse. Calados e voltados para dentro de si. Por fora pareciam sérios e frios; por dentro eram vulcões em atividade.
Seja como for, a manhã surgiu timidamente por detrás dos edifícios da Avenida 16 de novembro. A mistura de vinho e cerveja, não caiu muito bem a Silvio, que dormia sentado. Eduardo também já tinha dado umas cochiladas anteriormente. Na mesa vizinha pediu-se a conta. Vão-se abraçado um casal de jovens homossexuais, que se beijavam ainda pouco calorosamente.
Eduardo olhou para aquele seu amigo de infância adormecido: a cabeça um pouco inclinada para trás deixando sua boca entreaberta de onde escorria uma fina e prolongada baba do canto esquerdo avançando em direção ao pescoço. Eduardo então pensou no futuro que ainda viria para ambos. E ele não via absolutamente nada de interessante.
Era como se não houvesse saída, um lugar realmente seguro e livre de tudo aquilo que os oprimia e os deprimia. Aquela cidade com aquelas pessoas parecia uma jaula por demais apertada. Era difícil olhar naquelas faces diariamente, pior ainda era ouvir seus pensamentos e suas ideias sobre isso e aquilo outro. Talvez o caminho fosse mudar de cidade, de estado, de país; talvez o caminho fosse mudar de planeta. Eduardo não queria ser um homossexual. Mas ele também não queria um casamento convencional, com filhos e tudo mais. Eduardo não queria ser um universitário e muito menos um assalariado explorado e humilhado. Ele ainda não sabia de porra nenhuma, mas sabia das coisas que ele não poderia fazer, muito embora seu amigo e ele fossem obrigados a fazê-las num futuro bastante próximo. As redes de supermercados da cidade tentariam domar a ambos com seus chicotes poderosos. Silvio se curvaria aos açoites das redes de supermercados por um tempo maior; já Eduardo, acabaria curvado diante de uma universidade infestada de pseudo-intelectuais de merda por um longo tempo.  Isso era desesperador. Não era à toa o motivo de tantos suicídios em nossa sociedade.
Eram agora somente Silvio e Eduardo naquele bar mitológico. A garçonete informa que já iria fechar.
- Ok, minha querida – diz Eduardo muito gentilmente. – Mas você não pode servir só mais uma?
- Não – diz ela guardando as mesas e cadeiras. - Temos que fechar mesmo, meu amor.
- Tudo bem – respondeu ele acordando seu amigo.
- O que foi, Eduardo? – despertou Silvio com os olhos arregalados e assustados. – Que porra, Eduardo! Não tem mais cerveja nesta garrafa! Eu preciso de um gole…
Ainda havia meio copo de cerveja. Silvio bebeu de uma só golada como tinha de ser. Depois pediram a conta, levantaram pesados e desceram a 16 de novembro até a Praça Amazonas. Dali cada um deveria seguir individualmente seu caminho até suas casas.

Despediram-se logo em seguida. Cada um rumou para sua caverna. Cambaleando, em ziguezague pelas ruas. Dormir até meio-dia ou mais enquanto o futuro não chegava valendo.

(Texto e foto: Walter Rodrigues)