Então ele foi atender o
telefonema. Era a mulher que ele estava
já fazia alguns anos. Se ele a amava? Na verdade era difícil acreditar. O que
ele esperava dela? Alguma coisa que ela
demonstrasse que lhe fazia falta. Daniel não sabia onde ele estava. E ele
queria que alguma boceta com cérebro lhe encontrasse. Ela jamais saberia onde
ele estava... Ele estava perdido onde ele não saberia. Os recônditos da alma é
algo difícil de sondar. Pois não há mar, não há desertos infinitos e universos
idem que nos levem a total compreensão da personalidade humana.
Uma boceta com cérebro nos faz
repensar todo um projeto de vida. Daniel
havia conhecido umas bocetas dessas. Onde ir em situações semelhantes? Um
namoro malfadado jamais dará conta disso. Para onde ir e o que fazer? O
desespero se instala...
Nem a máquina de escrever com sua
presença ilustre ao abrir da porta jamais resumirá o outono desses dias sem
sol.
Beethoven com seus dó, ré, mi, fá, só, lá, si jamais
reproduzirá a sinfonia de todo um dia como esse...
- Álvares as coisas andam meio
fora do lugar – falou-me Daniel com um tom zombeteiro.
- Elas costumam andar sempre
assim... – respondi muito calmamente.
- Tu não bebeste todo o vinho,
né?
- Ainda tem aqui.
- Acho que vamos precisar de um
pouco mais.
- É fato.
E assim avançamos pelas ruas
daquele município onde agora eu estava morando. Zona Metropolitana da cidade de
Belém. Foda-se! Tudo parecia tão e infinitamente distante do nosso bairro de
origem, o Jurunas. Tudo aquilo parecia uma prolongada piada de muito mal gosto.
Mas precisávamos tomar umas pela ordem social vigente, pelas crianças que
morriam de fome na África, pelo Messias aguardado pelos cristões e judeus, por
toda merda que está no início do reto aguardando para se liberta fossa abaixo!
A vida era muito gozada. Vivia fodendo e gozando de tudo e de todos. Queria ser
uma foda menos fodida às vezes. Mas sempre a maldita acabava gozando de mim. O que
Daniel estava querendo naquela noite? Bancar o comedor e inflar mais e mais seu
maldito superego? Haveria bebida? Haveria saída? As músicas em espanhol
continuavam a tocar eternamente...
(Walter Rodrigues)
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